Incidência do ISS na exportação de serviços

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Exportação de serviços

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Mergulhe no debate sobre a incidência do ISS na exportação de serviços. Entenda a diferença entre as teorias do resultado-utilidade e resultado-consumação.

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A desoneração do ISS sobre serviços exportados está prevista em diferentes níveis normativos. A Constituição Federal, em seu artigo 156, §3o, inciso II, confere à legislação complementar, em relação ao ISS, a competência para “excluir da sua incidência exportações de serviços para o exterior”. Em atenção ao referido comando constitucional, a Lei Complementar n. 116/03, em seu artigo 2o, I, parágrafo único, estabeleceu hipótese de não incidência da norma desonerativa de ISS para serviços objeto de exportação [1].

Há, ainda, alguns municípios que impõem em suas legislações um temperamento adicional, afastando a norma desonerativa quando o serviço for “desenvolvido e concluído” no município [2]. Os dois textos normativos (a Constituição e a lei complementar federal) podem ser resumidos da seguinte forma: (i) a Constituição prescreve que a exportação de serviços não está compreendida na competência tributária do ISS, (ii) a lei complementar federal vai no mesmo sentido, estabelecendo que, se o resultado do serviço for verificado no município em que o serviço foi iniciado, então não se aplica aludida desoneração.

Perceba que a lei complementar, ao prescrever que “não se enquadram no disposto no inciso I os serviços desenvolvidos no Brasil, cujo resultado aqui se verifique, ainda que o pagamento seja feito por residente no exterior”, estabelece dois requisitos cumulativos, em seu núcleo semântico, para a desoneração do ISS: a) que o tomador seja residente no exterior e b) que o resultado se verifique no exterior.

Com relação ao primeiro requisito, elemento mais simples da norma, inexistem grandes digressões a serem feitas. Basta a verificação do domicílio do tomador de serviços para constatar que, estando ele fora do país, a condição está atendida. No que toca o segundo requisito, a interpretação do parágrafo único e inc. I do art. 2o da Lei Complementar n. 116/03 gravita em torno do sentido atribuído à palavra resultado.

Aludido termo, no âmbito legal, ensina a doutrina, foi empregado com a intenção de caracterizar a prestação do serviço a não-residente [3]. Nesse aspecto, a doutrina e a jurisprudência convergem para a ideia de que o resultado do serviço, para configurar exportação e afastar a exigência do ISS, deve ocorrer no exterior. Se, por exemplo, uma empresa, sediada em São Paulo/SP, presta serviços de licenciamento de software e disponibiliza a sua tecnologia em nuvem e o tomador está localizado em Paris e utiliza a ferramenta no exterior, então estaria materializada a exportação do serviço. Na teoria do resultado-utilidade isso seria o suficiente para que os efeitos da prestação de serviço se materializem no exterior – e não que a execução do serviço deve se dar necessariamente em outro país.

Do outro lado está a teoria do resultado-consumação, que pode ser traduzida na ideia de que o ISS será devido quando o serviço for concluído no município, a despeito da utilidade ocorrer no exterior. É dizer, em outras palavras, que, se o serviço for finalizado no âmbito territorial do município, não há exportação. Naquele mesmo exemplo da empresa paulista que fornece a tecnologia para o usuário francês, inexistiria exportação dos serviços no contexto do ISS, pois o software foi desenvolvido e “disponibilizado” em São Paulo.

Exportação de serviçosExportação de serviços

Confrontando as duas possibilidades de compreensão sobre o assunto (resultado-utilidade vs. resultado-consumação), a teoria do resultado-utilidade parece fornecer o melhor raciocínio para compreender a questão. Trata-se da interpretação cujo racional subjacente é o de que o ISS não deve ser oferecido à tributação nas prestações de serviços que sejam desenvolvidas e concluídas no âmbito territorial do município, mas cujos efeitos se verifiquem fora do País, para destinatários localizados no exterior.

Se bem observarmos a lógica oculta nesta forma de pensar, veremos que ela leva em consideração que a expressão resultado não significa a prestação do serviço deva ocorrer no exterior, mas toma em consideração os efeitos do serviço.

No ponto, vale frisar que o objetivo previsto pelo constituinte, em última análise, é deixar livre da tributação os serviços desenvolvidos no país e usufruídos no exterior. A despeito do posicionamento defendido neste breve estudo, esse tema permanece controvertido no âmbito dos tribunais, com jurisprudência ligeiramente favorável aos contribuintes. Para ilustrar, vejamos o AgInt no AREsp 1446639/SP, em que a Segunda Turma do STJ, aplicou a concepção do resultado-utilidade:

O Superior Tribunal de Justiça adotou, em primeiro momento, a teoria do resultado-consumação, ao concluir, no REsp nº 831.124/RJ, por maioria, que o serviço de reparo e revisão de motores e turbinas de aeronaves para clientes estrangeiros “não configura exportação de serviço, pois o objetivo da contratação, o resultado, que é o efetivo conserto do equipamento, é totalmente concluído no nosso território”, […]

Por outro lado, ao apreciar, mais recentemente, o AREsp 587403/RS, esta Corte parece ter adotado o conceito de resultado-utilidade, ao decidir que “a remessa de projetos de engenharia ao exterior poderá configurar exportação quando se puder extrair do seu teor, bem como dos termos do ato negocial, (…) a intenção de sua execução no território estrangeiro”, já que “as provas dos autos revelaram a finalidade de execução do projeto em obras que só poderiam ser executadas na França (…)”

[…] o ponto central deste debate examina se o resultado do serviço prestado pela recorrente, assim entendido como a utilidade que ele visa criar ao contratante, efetivamente ocorreu no exterior, conforme sustenta a contribuinte, ou em território nacional, conforme defende a municipalidade. […]”.[4]

Seguindo essa linha, se o resultado do serviço for verificado no exterior, então resta caracterizada a exportação de serviços. Até porque, note-se, se considerarmos que a exportação de serviços pressupõe que ele seja “desenvolvido e concluído” no exterior, então as hipóteses de exportação seriam muito restritas, pois o que ocorreria, nestes casos, é nada mais do que a prestação do serviço no exterior, não para o exterior. Essa leitura, em termos práticos, esvaziaria a finalidade pensada pelo legislador constitucional e inviabilizaria a possibilidade de um serviço ser considerado exportado para fins tributários. Note-se que, na teoria do resultado-consumação, não há exportação, mas prestação do serviço em local fora da competência tributária municipal.

Por fim, repisa-se que a melhor leitura do assunto segue a concepção do resultado-utilidade, assim entendido como o proveito ou a utilidade proporcionada ao tomador, que o contratou devido a essa utilidade, ocorra no exterior, não se confundindo resultado com a própria prestação ou conclusão do serviço.           
 


[1] Art. 2o O imposto não incide sobre:    
I – as exportações de serviços para o exterior do País;   
[…]
Parágrafo único. Não se enquadram no disposto no inciso I os serviços desenvolvidos no Brasil, cujo resultado aqui se verifique, ainda que o pagamento seja feito por residente no exterior.

[2] É o caso, veja-se, do Município de Florianópolis. Eis o teor do art. 248 do Código Tributário Municipal:
Art. 248. O imposto não incide sobre:   
I – as exportações de serviços para o exterior do País;    
[…]
Parágrafo Único – Não se enquadram no disposto no inciso I os serviços aqui desenvolvidos e concluídos, ainda que o pagamento seja realizado por contratante residente no exterior.

[3] RAMALHO, Mariana Oiticica. ISS – Serviço de Importação e Exportação, Imposto sobre Serviços de acordo com a Lei Complementar n. 116/03, Quartier Latin, 2004, p. 121/123 in MELO, José Eduardo Soares. Impostos Federais, Estaduais e Municipais, Livraria do Advogado, p. 361.

[4] AgInt no AREsp 1446639/SP, Rel. Ministro MAURO CAMPBELL MARQUES, SEGUNDA TURMA, julgado em 19/09/2019, DJe 24/09/2019.

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